imagem: rogério pinto

6.4.08

A subjetividade do abandono na pintura de Rogério Pinto



A pintura de Rogério Pinto quer resignificar a imagem, refazê-la, reconstruí-la, deformá-la, tirá-la da fôrma, dar nova forma, poetizá-la. E a princípio esta sempre foi a consciência daqueles que se aplicaram a arte pictórica. No entanto, para isso, Rogério faz uso de imagens oriundas da fotografia; as seleciona, recorta, escolhe e compõe uma espécie de colagem no computador, depois as imprimi na tela. Este primeiro gesto mecânico antecede a ação física da pintura, mas não é menos importante.


A memória da primeira imagem, para não se perder, luta contra o esquecimento. Rogério quer anular o processo inicial, e do embate (raspar, sobrepor camadas de tinta, repintar e apagar figuras) entre uma imagem eleita e a composição pictórica, nasce a sua poética: dar um novo corpo para um registro visual encarcerado e esquecido no tempo.
Rogério une símbolos perdidos entre si e os harmoniza como se tivessem vivido juntos desde sempre; uma girafa com o número 5, uma garotinha sentada com uma pantufa de coelhinho, um cabide suspenso e um sapato são companhias para um rosto que não se vê e o número 2.
Rogério faz pintura por excelência; a cor e o espaço bidimensional são o seu material bruto, mas não dá para chamá-lo de formalista, isso seria reduzir o potencial simbólico de seu trabalho.
Deste modo, a sua pintura é, em seu processo, impregnada de uma subjetividade do abandono, daquilo que está desamparado, deixado de lado, largado. São imagens que ninguém mais quer que Rogério escolhe para o seu trabalho, explico: Rogério não escolhe imagens populares de famosos ou de apelo midiático, opta pelas esquecidas. Processo, aliás, que apesar de resultar numa pintura, está desde seu início tomado pela idéia do registro fotográfico e de seu rastro, sua memória no tempo.


Pinturas como o Homem Dividido (acima), e mesmo uma série de retratos anônimos são representações do abandono, do esquecimento, daquilo ou daquele que já não interessa e que Rogério dá novo sentido, reelaborando, desmembrando e recompondo as coisas, os seres e os signos que evoca. Com gestos que estão entre ternura e vigor, apropriação e criação, figuração e abstração, impermanência e eternidade, urgência e contemplação.
Parece que a pintura de Rogério quer nos dizer que sem o encontro com o passado o presente se esvazia e, por isso, desmembra os corpos, como se emergisse daquela imagem primeira o homem contemporâneo; cindido e sem unidade por si. Ressalta e valoriza as partes: um pé, um chapéu, uma cabeça, um sapato, uma parte de um animal, um número; para reorganizá-los. E no ato de composição/compaixão Rogério os harmoniza com o presente, revelando as partes que compõe o todo e vice-versa, dando-lhes vida nova, enchendo-lhes de sentido e de uma esperança velada por sua aparente desilusão.


E exatamente por anular em seu processo criativo o que, de certa maneira já estava anulado pelo tempo e desinteresse alheio, é que as imagens fotográficas inicialmente escolhidas por Rogério - figuras de abandono – renascem em sua pintura como a ave mitológica Fênix, só que já não são as mesmas.

2 comentários:

LUISA BRANDT disse...

Oi Marcelo!

Que lindo, adorei a leitura que vocês fez!

Tbm gostei muito desse trabalho... eu tenho como símbolo tbm esses "terninhos" umas roupinhas que têm vida. Gostei de conhecer!

Abraços!

Gina Dinucci disse...

E quando esse meu amigo vai falar do meu trabalho?
Topas?

beijo